O Novo Federalismo Social e o Rio: Desenho de Programas Complementares de Transferência de Renda Condicionada - Neri, Marcelo Cortes
Sobre o paper:
A política pública brasileira entrou num novo federalismo social. Estados e municípios atuam integrados sobre a plataforma do Programa Bolsa Familia (PBF), complementando ações federais com inovações locais. O estado e o município do Rio de Janeiro criaram programas, chamados respectivamente, Renda Melhor (RM) e Família Carioca (FC) lançando mão da estrutura operacional do PBF, que facilita obter informações, localizar beneficiários, emitir cartões, sincronizar datas de pagamentos e senhas, além de introduzir novas condicionalidades. O sistema de pagamento de cada programa completa a renda estimada das pessoas até a linha de pobreza fixada, dando mais a quem tem menos. Complementação similar foi posteriormente adotada no BSM e no Ingreso Ético Familiar chileno, que segue também o princípio de estimação da renda usado. Em lugar da renda declarada, a definição do valor das bolsas do Rio usa o rico acervo de informações do CadÚnico: configuração física da moradia, acesso a serviços públicos, educação e trabalho de todos os familiares, presença de pessoas vulneráveis, com deficiência, grávidas, lactantes, crianças etc e mais transferências oficiais como o PBF. Com essa miríade de ativos e carências, estima-se a renda permanente de cada um. O benefício básico é definido pelo hiato de pobreza, dando prioridade aos mais pobres. Os programas usam referências internacionais como campo neutro entre níveis e mandatos de governo. A linha de pobreza dos dois programas é a mais alta da primeira meta do milênio da ONU: US$ 2 diários por pessoa ajustados pelo custo de vida. A outra linha da ONU, de US$ 1,25, foi implicitamente adotada em 2011 na fixação da linha nacional de extrema pobreza. O intercâmbio de metodologias entre entes federativos tem se dado em mão dupla. O FC começou pelos 575 mil cariocas que estavam na folha de pagamentos do PBF. Seu sistema de avaliação de impactos acompanha também, como grupo de controle, estudantes incluídos no CadÚnico, mas não no PBF, o que é possível porque todos os alunos da rede municipal fazem exames bimestrais padronizados. Nas condicionalidades educacionais, os dois programas premiam avanços escolares, vantagem potencial para quem mais precisa avançar. O programa municipal exige maior frequência escolar que o PBF e presença de um responsável nas reuniões bimestrais aos sábados. Os alunos precisam atingir nota 8 ou melhorar pelo menos 20% a cada exame para receber um prêmio bimestral de R$ 50. Não há limite de prêmios por família e os requisitos são diferenciados em áreas conflagradas da cidade. Na primeira infância, priorizamse crianças pobres do CadÚnico em creches, pré-escolas e atividades complementares. O programa estadual atinge mais de um milhão de fluminenses com sistema de pagamento similar ao municipal. Além disso, inova dando prêmios a alunos do Ensino Médio, aplicados em caderneta de poupança. O prêmio é crescente e pago ao estudante, que pode sacar até 30% anualmente. O total pode chegar a R$ 3.800 por aluno de baixa renda. Estado e cidade premiam profissionais de educação conforme o desempenho dos alunos e completam a cadeia de incentivos na demanda de estudantes pobres e seus pais. O avanço no desempenho é maior entre os beneficiários e a presença dos responsáveis em reuniões é o dobro. Há paralelo com programa de Houston nos Estados Unidos, que também aposta no alinhamento de incentivos a professores, pais e alunos. De maneira geral, a receita é explorar complementaridades estratégicas, onde o todo é maior que a soma das partes. Impulsionar, por meio de metas e incentivos, sinergias entre atores sociais (professores, pais, alunos), entre áreas (educação, assistência, trabalho) e níveis de governo. Estes programas buscam somar recursos e dividir trabalho para multiplicar interações e fazer a diferença na vida dos pobres.