Na semana em que completou 10 anos da morte de André Urani, houve homenagem ao economista com um seminário de dia inteiro sobre o futuro do Rio na Casa Firjan. O evento foi aberto pelo Prefeito da cidade do Rio de Janeiro - Eduardo Paes, prefácio de Marina Silva. Marco Bonomo, Manuel Thedim, José Guilherme Reis e Tomas Urani organizaram o evento. Marcelo Neri, diretor do FGV Social, participou da mesa “Desenvolvimento Social do Rio”. Veja a programação do evento clicando aqui (assista também ao final do texto os vídeos do evento, além do vídeo da inauguração da Escola Municipal André Urani).
Confira o artigo escrito pelo diretor do FGV Social:
A Falta que o André Faz
Paulistas, mineiros, pessoas de outros estados, mesmo aqueles nascidos na capital federal, escrevem com frequência sobre a sua localidade. Os títulos dos principais jornais destes locais refletem isso: Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, Estado de Minas e o Correio Braziliense. No Rio de Janeiro, os principais jornais são o Globo, O Dia e o antigo Jornal do Brasil, o que reflete a baixa preocupação com questões locais.
Economistas cariocas traçaram as principais políticas públicas nacionais, do PAEG ao Real, passando pelo plano Cruzado e chegando ao regime macroeconômico vigente, mas não só no aspecto econômico: do desenho do SUS ao Bolsa Família, passando pelo seu precursor o Projeto Alvorada das bolsas federais.
Agindo no Rio - Pessoas de fora olham para dentro do Rio, cariocas olham para fora do Rio. Esta era a regra. André Urani, nascido na Itália e criado em São Paulo, olhou profundamente para o Rio, sem perder de vista o Brasil e o resto do mundo. Ele é o melhor exemplo que conheço do Pensar Global, Agir Local.
André explorou nova agenda de política pública, como bom filho da PUC-Economia tinha esta inquietação com política pública. Apenas para exemplificar foco aqui mais em inclusão produtiva, onde estamos patinando há anos. RioCred, ATA são exemplos de programas pioneiros do milênio passado criados pelo então Secretário de Trabalho da Cidade do Rio de Janeiro.
Tive o prazer de compartilhar comissões lideradas por ele que redundaram em melhoramentos da pesquisa ECINF 2003, no lançamento do MEI em 2009, em programas locais de assistência continuada em 2011, Ele proporcionou revolução da ação voltada para a base do empreendedorismo. Seus Boletins do Mercado de Trabalho, as dezenas de pesquisas de campo domiciliares e produtivas realizadas nas mais diversas comunidades do Rio de Janeiro a partir da experiência na Vila Canoas situada ao lado de sua casa. Estes são alguns exemplos da perseverança do dia a dia do trabalho empreendido por ele.
L, V ou W? - Fiz pesquisa que dialoga com o seu último livro “A Hora da Virada”, organizado por ele com o Fábio Giambiagi em 2011. Não conseguimos rejeitar a hipótese que houve a tal virada na Cidade do Rio de Janeiro durante o ciclo pré-Olímpico. Decadência ocorrida desde que deixou o status de capital federal virou expansão em relação a grupos de controle. Isto não só nas dimensões turísticas e de infraestrutura intrínsecas aos jogos mas em aspectos sociais como educação, trabalho, pobreza, acesso a bens privados, moradia e serviços públicos entre outras (as exceções são esgoto e tempo de transporte). Subimos o Olimpo, mas após os jogos nos jogamos do lado de lá. O problema é que Rio se escreve com W.
Toda a análise de indicadores econômicos e sociais, em particular no Estado do Rio como PIB e renda, requer cuidado pois não houve ajuste. Ou seja, antes de colher resultados consistentes ainda vamos ter de incorrer nos custos dos ajustes.
O que é especial no Rio? - O Rio não é um lugar de jovens bronzeados, mas de idosos igualmente bronzeados. Somos uma espécie de Flórida brasileira, temos a unidade da federação a capital e a periferia metropolitana com a maior proporção de idosos do país. Há a necessidade crônica de uma reforma da previdência. Voltando ao W da questão, e a nossa dificuldade de lidar com escolhas coletivas como a agenda de reformas que ainda não foi implantada no Estado do Rio de Janeiro.
O Rio é o estado mais metropolitano da federação com ¾ da população vivendo no Grande Rio. Temos mais os problemas das grandes cidades, como na tal da baleia encalhada que o André falava. Por exemplo, na última Síntese dos Indicadores Sociais maior percentual de pessoas sujeitas a inundação e o maior tempo de transporte. O Rio está repleto de problemas coletivos: desigualdade, informalidade, criminalidade entre outros tantos problemas urbanos.
A desigualdade aqui é visível a olho nu, dificulta dialogo e soluções em todas essas frentes. Rio é “A Cidade Partida”, dividida entre o asfalto e o morro. Já São Paulo, ou Brasília, são ilhas de riqueza rodeadas por periferias pobres. Exemplo de local carioca de contraste de renda pelo local de moradia é entre a Gávea e a Rocinha. Como notou o André ao lançar atlas pioneiro sobre bairros do Rio: ao atravessar a Rua Marques de São Vicente (onde hoje há uma escola modelo com o nome dele) saímos de IDH africano para IDH europeu. Já por local formal de trabalho, a Ilha do Fundão é o bairro com maior renda e educação bem e fica em frente do Complexo da Maré.
O enfrentamento desta miríade de problemas coletivos requer muita concertação dos diferentes atores da sociedade. Esta é a área onde a contribuição que o André nos dava todos os dias é insuperável. André Urani era capital social em estado puro.
Marcelo Neri
Veja a fala de Neri no evento (18 min): https://www.youtube.com/watch?v=_tK3sHfwDN0
Confira o evento na íntegra (8h40min): https://www.youtube.com/watch?v=ZhOjS6KAWQU
Assista ao vídeo da Inauguração da Escola Municipal André Urani, em 2012 (7 min): https://www.youtube.com/watch?v=LWfiUFVIVmc